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(Foto tirada na Av. dos Aliados, 15 de Setembro de 2012) |
O texto que se segue foi um contributo do escritor José Luís Peixoto para o MayDay Lisboa.
Já é antigo mas não podia ser mais actual.
Se
te quiserem convencer que é impossível, diz-lhes que impossível é
ficares calado, impossível é não teres voz. Temos direito a viver.
Acreditamos nessa certeza com todas as forças do nosso corpo e, mais
ainda, com todas as forças da nossa vontade. Viver é um verbo enorme,
longo. Acreditamos em todo o seu tamanho, não prescindimos de um único
passo do seu/nosso caminho.
Sabemos bem que é inútil resmungar
contra o ecrã do telejornal. O vidro não responde. Por isso, temos
outros planos. Temos voz, tantas vozes; temos rosto, tantos rostos. As
ruas hão-de receber-nos, serão pequenas para nós. Sabemos formar marés,
correntes. Sabemos também que nunca nos foi oferecido nada. Cada
conquista foi ganha milímetro a milímetro. Antes de estar à vista de
toda a gente, prática e concreta, era sempre impossível, mas viver é
acreditar. Temos direito à esperança. Esta vida pertence-nos.
Além
disso, é magnífico estragar a festa aos poderosos. É divertido,
saudável, faz bem à pele. Quando eles pensam que já nos distribuíram um
lugar, que já está tudo decidido, que nos compraram com falinhas mansas e
autocolantes, mostramos-lhes que sabemos gritar. Envergonhamo-los como
as crianças de cinco anos envergonham os pais na fila do supermercado.
Com a diferença grande de não sermos crianças de cinco anos e com a
diferença imensa de eles não serem nossos pais porque os nossos pais, há
quase quatro décadas atrás, tiveram de livrar-se dos pais deles. Ou,
pelo menos, tentaram.
O único impossível é o que julgarmos que
não somos capazes de construir. Temos mãos e um número sem fim de
habilidades que podemos fazer com elas. Nenhum desses truques é
deixá-las cair ao longo do corpo, guardá-las nos bolsos, estendê-las à
caridade. Por isso, não vamos pedir, vamos exigir. Havemos de repetir as
vezes que forem necessárias: temos direito a viver. Nunca duvidámos de
que somos muito maiores do que o nosso currículo, o nosso tempo não é um
contrato a prazo, não há recibos verdes capazes de contabilizar aquilo
que valemos.
Vida, se nos estás a ouvir, sabe que caminhamos na
tua direcção. A nossa liberdade cresce ao acreditarmos e nós crescemos
com ela e tu, vida, cresces também. Se te quiserem convencer, vida, de
que é impossível, diz-lhe que vamos todos em teu resgate, faremos o que
for preciso e diz-lhes que impossível é negarem-te, camuflarem-te com
números, diz-lhes que impossível é não teres voz.
José Luís Peixoto